Historia Sensorial Serviço Harmonização BJCP

English Pale Ale

A sofisticação do amargor

Origem:
Inglaterra

Data:
1703

A cerveja é uma bebida milenar e vem acompanhando e colaborando com a evolução da humanidade. Lá em meados do século XVII, os cervejeiros buscavam novas técnicas de produção para que pudessem produzir brejas com maior variedade de características.
Como você deve imaginar, há centenas de anos não existiam equipamentos que permitissem um controle mais preciso das etapas de fabricação de qualquer coisa. Com isso, quando pensamos em cerveja, todas acabavam sendo parecidas: cores mais escuras, turvas e com um toque de defumado, já que normalmente era usada madeira ou carvão para a secagem dos grãos durante o processo de malteação.
Após anos de experimentos, e com um empurrãozinho da Revolução Industrial no início do século XVIII, a utilização de combustíveis líquidos e do surgimento de equipamentos em aço possibilitou um controle bem maior do nível de torrefação dos grãos essenciais para a fabricação do nosso líquido sagrado. O resultado? Maltes mais claros. E é aí que a English Pale Ale entra nessa história!

Tá tudo bem? Você está meio pálida...

Nesse período, a Escola Inglesa já oferecia alguns estilos que enchiam os copos dos europeus, e os mestres cervejeiros ingleses resolveram explorar aquela tal novidade de maltes claros. Uma das regiões pioneiras nessa caminhada foi Burton-on-Trent, na Inglaterra, e a breja produzida foi batizada de Pale Ale – e esse nome, que apareceu pela primeira vez em 1703, já diz muito sobre elas.
O termo "Pale" em inglês significa "pálido" e Ale é a família de cervejas de alta fermentação. Ou seja, a Pale Ale surgiu como uma "cerveja clara" para os padrões da época, por exemplo quando comparadas às escuras e opacas Brown Ales muito consumidas naquele período.
Mas não foi nada fácil tomar conta de um mercado acostumado com líquidos mais densos, com aspectos visuais tão diferentes e sabores novos para os paladares acostumados com gosto de fumaça e torra. As Pale Ales se popularizam pra valer entre os ingleses apenas em meados de 1800, quando enfim assumiu a denominação de English Pale Ale.

O que vale mesmo é o sabor!

Contudo, se você encontrar alguém por aí pedindo uma Bitter, não estranhe. Não há um consenso sobre a distinção desses termos e seus respectivos estilos. Vários estudiosos do universo cervejeiro assumem que English Pale Ale e Bitter são a mesma coisa. Inclusive, no guia de estilo Beer Judge Certification Program (BJCP) são descritas apenas as Bitters como sendo originadas a partir das English Pale Ales. Em contrapartida, o documento da Brewers Association (BA) descreve os estilos individualmente.

Pra não ficar em cima do muro nessa polêmica, vamos considerar a "distinção" apresentada por dois dos maiores autores sobre cerveja na história: Randy Mosher e Garrett Oliver têm o entendimento de que Bitter é a cerveja inglesa quando mantida e servida a partir de barris, e Pale Ale quando filtrada e engarrafada.
Independentemente do nome pelo qual você peça a sua English Pale Ale, ou uma das versões de Bitter (vamos falar um pouquinho mais sobre isso no próximo tópico, então continue na leitura, belê?), o que realmente importa são os aromas e sabores que encontrará no seu copo!

Aproveitando o gancho acima, vamos pro que interessa. Deixando a teoria e a polêmica de lado, de maneira geral uma English Pale Ale tem colorações que podem ir de dourado-escura a âmbar-escura (com aquela tonalidade cobre bem intensa). Normalmente, ainda falando do seu visual, esse tipo de breja é límpida e brilhante. Mas você pode encontrar exemplares com certa turbidez.
As brejas dessa categoria possuem carbonatação baixa ou moderada. Na prática isso significa que elas possuem pouco "gás", e consequentemente não devem ter alta formação de espuma, que geralmente é de cor branca.
O grande destaque das English Pale Ales é o equilíbrio entre malte e lúpulo, promovendo uma experiência muito agradável de degustação. O malte fica responsável por trazer notas de pão, biscoito, leve tostado e caramelo – que é a marca registrada do estilo e deve ser perceptível com suavidade no aroma e ganhar potência no sabor.
Por sua vez, o lúpulo promove amargor de média a alta intensidade, mas sem excessos que acabam sobrepondo as características do malte, aliado a aspectos sensoriais terrosos, resinosos, frutados ou florais.

O corpo médio (líquido não tão denso, mas nem tão leve), o teor alcoólico que fica entre 3% e 7% de ABV e o final seco são o arremate final para um altíssimo drinkability, ou seja, cervejas muito fáceis de serem bebidas!

Escala de intensidade

Retomando o papo de English Pale Ale e Bitter, apesar desse impasse nominal, é consenso que existem 3 variações clássicas do estilo que basicamente são distintas pela intensidade de aromas e sabores, nível de amargor e teor alcoólico.
Ordinary Bitter (ou Standard Bitter): cerveja de cor âmbar-clara com delicados aromas e sabores de malte, especialmente de biscoito, com notas florais e herbais tradicionais dos lúpulos ingleses. Possui baixo dulçor e amargor, além de corpo baixo. É a versão mais leve entre elas.
Best Bitter (ou Special Bitter ou ainda Premium Bitter): a coloração âmbar ganha leve intensificação, bem como os aromas e sabores. Aqui as notas de caramelo começam a ficar mais perceptíveis, equilibradas com o aumento proporcional de amargor e corpo.
Strong Bitter (ou Extra Special Bitter): brejas desse tipo possuem cor mais escura, chegando a tons de cobre. Tanto no aroma quanto no sabor, as notas de caramelo e toffee dos maltes ganham destaque. O dulçor é "segurado" pelo amargor mais pronunciado e a intensificação das nuances florais e herbais.

Pros curiosos de plantão

Quando falamos de Strong Bitter é inevitável falar do rótulo da Fuller`s chamado Extra Special Bitter. Ele fez tanto sucesso que acabou sendo associado diretamente ao estilo – assim como acontece com outros produtos (ex: quem fala hastes flexíveis em vez de Cotonete?).

COPO SUGERIDO:
Pint

TEMPERATURA IDEAL:
De 5 a 8°C

Na hora de servir uma English Pale Ale, seja lá qual for a sua intensidade de aromas e sabores, não tem erro: ela não exige nenhuma técnica ninja ou "ritual" a ser seguido. Basta usar o bom e velho método de colocar o copo num ângulo de 45º (naquela tradicional diagonal) e começar a despejar o precioso líquido até que ele atinja a metade do recipiente. Aí é só voltar o copo pra vertical e terminar de encher.
O que pode favorecer a sua degustação é usar o tipo de copo "ideal". No caso desse estilo é o Pint, que possui formato cilíndrico com a base mais estreita que a boca, ajudando na percepção dos aromas enquanto se bebe a breja. O Pint inglês tradicional possui 568 ml, e lá na Inglaterra os bares que não servem com essa medida podem ser multados!

Os tipos de copos ideias são o Mug, aquele canecão parrudo e com alça que cabe até 1 litro de breja, e o Pint, o tradicional recipiente dos pubs ingleses e americanos (mas que têm se popularizado nos bares brasileiros) com a boca mais larga que que a base e aquela saliência logo abaixo da borda.

Pato ao molho
de laranja

Bacalhau
a portuguesa

carpaccio

Os mestres da harmonização consideram a Brown Ale como uma das cervejas mais versáteis na hora de combinar aromas e sabores com pratos das mais diversas origens culinárias.
Por exemplo, o seu dulçor evidente combina muito bem com carnes preparadas de diferentes maneiras, principalmente assadas. Ela pode acompanhar inclusive carnes mais exóticas, como javali, codorna e faisão. Portanto, uma Brown Ale pode fazer a diferença no churrascão de domingo, tomando apenas cuidado para não pesar no adocicado caso pretenda usar molhos mais doces.

Confira a seguir algumas combinações pensadas a partir de cada subcategoria das Bitters para encher sua boca, e de quem mais estiver à mesa com você, com aromas e sabores que proporcionam uma experiência gastronômica completa.

Ordinary Bitter (ou Standard Bitter):
• Frango assado;
• Pato ao molho de laranja;
• Queijos duros, como provolone e emmenthal;
• Cookie de nozes com gotas de chocolate.
Best Bitter (ou Special Bitter ou ainda Premium Bitter):
• Bacalhau à portuguesa;
• Codorna recheada e assada na brasa;
• Paella de frutos do mar;
• Carne com chilli, taco ou burrito;
• Torta madalena (carne moída com purê de batata).
Strong Bitter (ou Extra Special Bitter):
• Carpaccio de carne com molho de alcaparras;
• Carnes assadas mais fortes, como coelho e faisão;
• Fish and chips;
• Cuque de goiabada.

A fami´lia das British Bitter surgiu das English Pale Ales como um produto de barril no final dos anos 1800. O uso de malte Cristal tornou-se macic¸o apo´s a Primeira Guerra Mundial. Tradicionalmente servida mais fresca e com baixa pressa~o (gravidade ou bomba manual) e a temperaturas de adega.
A maioria das verso~es em garrafa ou em kegs do Reino Unido, produzidas para exportac¸a~o, sa~o, na maioria das vezes, mais alcoo´licas e mais carbonatados que as verso~es de barril (cask) servidas nos pubs ingleses, e tem um cara´ter e diferente balanc¸o das suas contrapartes de caneca (que muitas vezes sa~o mais doces e menos lupuladas do que as verso~es em barril) na Gra~-Bretanha. Essas diretrizes refletem a versa~o do estilo "real ale", na~o as formulac¸o~es de exportac¸a~o de produtos comerciais.
Ha´ muitas variac¸o~es regionais de Bitters, que va~o desde as mais escuras e doces, servidos quase sem espuma, a`s mais claras, lupuladas e com espuma abundante. Ordinary Bitter

Impressão Geral: A baixa densidade, baixo nível de álcool e baixa carbonatação fazem com que esta seja uma cerveja session, fácil de beber. O perfil de malte pode variar no sabor e na intensidade, mas nunca deve ofuscar a impressão geral de amargor. A drinkability é um componente crítico do estilo.

Aroma: Baixo a moderado aroma de malte, muitas vezes (mas nem sempre), com um leve perfil de caramelo. Complexidade de malte de pão, biscoito ou leve tostado são comuns. Leve a moderado frutado. O aroma de lúpulo varia de moderado a nenhum, tipicamente com caráter floral, terroso, resinoso e/ou frutado. Geralmente não apresenta diacetil, embora seja permitido em níveis baixos.

Aparência: Cor âmbar clara ou acobreado clara. Claridade de boa a brilhante. Espuma branca a bege clarinho, de baixa a moderada formação. Pode ter uma espuma de baixo volume devido à sua baixa carbonatação.

Sabor: Amargor médio a moderadamente alto. Ésteres frutados moderadamente baixos a moderadamente altos. Moderado a baixo sabor de lúpulo normalmente com o caráter terroso, resinosa, frutado e/ou floral. Baixo a médio maltado com um final seco. O perfil de malte é tipicamente de pão, biscoito ou leve tostado. Um baixo a moderado sabor de caramelo ou toffee é opcional. O balanço é muitas vezes decididamente amargo, embora o amargor não deva sobrepor-se completamente o sabor de malte, os ésteres e o lúpulo. Geralmente sem diacetil, embora seja permitido em níveis muito baixos.

Sensação de Boca: Corpo baixo a médio-baixo. Carbonatação baixa, que pode ser moderada nos exemplares engarrafados.

Comentários: O membro com menos densidade da família das British Bitters, normalmente conhecida pelos consumidores como "Bitter" (algumas cervejarias se referem como Ordinary Bitter para distingui-la de outros membros da família).

Comparação de estilos: Algumas versões modernas são fabricadas exclusivamente com malte claro e são conhecidos como Golden Ales, Summer Ales ou Golden Bitters. A ênfase está na adição de lúpulo de amargor mas diferente e ao contrário do lupulado agressivo percebido do meio para o final, nas American Ales.

Estatística Vital:
OG: 1030-1039
FG: 1007-1011
IBU: 25-35
SRM: 8-14
ABV: 3,2-3,8%

Best Bitter

Impressão Geral: Uma cerveja de sessão cheia de sabor, e ainda refrescante. Alguns exemplares comerciais podem estar mais balanceados para o malte, mas isso não deve obscurecer a sensação geral de amargor. A drinkability é o componente crítico deste estilo. álcool que em uma Strong Bitter.

Aroma: Baixo a moderado aroma de malte, muitas vezes (mas nem sempre), com baixo para médio-baixo perfil de caramelo É comum uma complexidade de malte de pão, biscoito ou suave tostado. Leve a moderado aroma frutado. O aroma de lúpulo varia de moderado a nenhum, tipicamente com caráter floral, terroso, resinoso e/ou frutado. Geralmente não apresenta diacetil embora seja permitido em níveis muito baixos.

Aparência: Cor âmbar claro a cobre médio. Limpidez boa para brilhante. Espuma de baixa a moderada formação, branco a bege claro. Ela pode ter baixa estatura devido à sua baixa carbonatação.

Sabor: Amargor médio a moderadamente alto. Ésteres frutados moderadamente baixos a moderadamente altos. Moderado a baixo sabor de lúpulo, normalmente com o caráter terroso, resinoso, frutado e/ou floral. Baixo a médio maltado com um final seco. O perfil de malte é tipicamente de pão, biscoito ou leve tostado. Baixo a moderado sabor de ou toffee é opcional. O balanço é muitas das vezes decididamente amargo, embora o amargor não deve sobrepor-se completamente aos sabores de maltes, ésteres e lúpulos. Geralmente o diacetil não está presente, embora seja permitido a níveis muito baixos.

Sensação de Boca: Corpo médio-baixo a médio. Baixa carbonatação. Os exemplares engarrafados podem ter carbonatação moderada.

Comentários: Sabor de malte mais evidente do que em uma Ordinary Bitter; uma cerveja ale forte com intensidade de sessão.

Comparação de estilos: Mais álcool que em uma Ordinary Bitter e a maioria utilizando ingredientes de maior qualidade. Menos caráter de malte base ou caramelo e mais cor do que uma British Golden Ale. A ênfase está na adição de lúpulo de amargor, mas sem apresentar uma lupulagem agressiva como observado do meio para o final do gole nas American Ales.

Estatística Vital:
OG: 1040-1048
FG: 1008-1012
IBU: 25-40
SRM: 8-16
ABV: 3,8-4,6%
Strong Bitter

Impressão Geral: Uma Ale inglesa, amarga, de intensidade moderada a moderadamente forte. O balanço pode ser de bastante equilibrado e uniforme entre maltes e lúpulos a um pouco amargo. A drinkability é o componente crítico deste estilo. É um estilo bastante amplo que permite consideráveis interpretações do cervejeiro.

Aroma: Aroma de lúpulo moderadamente alto a moderadamente baixo, geralmente com notas florais, terrosas, resinosas e/ou com caráter frutado. O aroma de malte é de médio a médio-alto, opcionalmente, com um baixo a moderado componente caramelo. Ésteres frutados de intensidade média-baixa a média-alta. Geralmente diacetil não está presente, embora seja permitido em níveis muito baixos.

Aparência: Cor âmbar claro a cobre profunda. Limpidez de boa a brilhante. Espuma branca a bege clarinho, de baixa a moderada formação. Espuma baixa é aceitável quando a carbonatação também é baixa.

Sabor: Amargor médio a médio-alto, com sustentação em sabores de maltes evidentes. O perfil de malte é geralmente de pão, nozes, biscoito, leve tostado e, opcionalmente, tem um sabor moderadamente baixo a moderado caramelo ou toffee. Sabor de lúpulo moderado a moderadamente alto, com caráter tipicamente floral, terroso, resinoso e/ou frutado. Amargor e sabor de lúpulo devem ser notados, mas não devem dominar totalmente os sabores de malte. Ésteres frutados moderadamente baixos a altos. Opcionalmente pode ter baixos níveis de álcool. Final semi-seco a seco. Geralmente sem percepção de diacetil, embora seja permitido em níveis muito baixos.

Sensação de Boca: Corpo médio-baixo a médio-alto. Carbonatação baixa a moderada, embora nas versões engarrafadas será mais alta. Versões mais fortes podem ter um ligeiro calor alcoólico, mas esse caráter não deve ser muito alto.

Comentários: Atualmente na Inglaterra, "ESB" é uma marca registada pertencente à Cervejaria Fuller’s e ninguém pensa que se trata de um estilo de cerveja genérico. É uma cerveja única (mas muito conhecida) que tem um perfil de maltes fortes e complexo, não encontradas em outros exemplares, muitas vezes levando os juízes a penalizar as English Strong Bitter tradicionais. Nos Estados Unidos, ESB tem sido usado para descrever uma Brittish Pale Ale maltada, amarga, avermelhada, de intensidade standard (para os EUA), sendo um estilo popular de cerveja artesanal. Isso pode acarretar que alguns juízes pensem, em equívoco, que as ESBs dos brewpub americanos são representantes deste estilo.

História: As Strong Bitters podem ser vistas como uma versão com maior densidade do que as Best Bitter (embora não necessariamente "mais premium" já que a Best Bitter são tradicionalmente feitas com os melhores ingredientes). As Pale Ale britânicas são geralmente consideradas premium, com uma intensidade de exportação e amargas, algo que se aproxima das Strong Bitters, mas reformulado para ser engarrafada (incluindo aumento nos níveis de carbonatação). Enquanto as British Pale Ales modernas são consideradas Bitters engarrafadas, historicamente os estilos eram diferentes.

Comparação de estilos: Sabores de malte e lúpulo mais evidentes do que em uma Special ou Best Bitter, assim como mais álcool. Versões mais fortes podem sobrepor-se um pouco com as British Strong Ale, embora as Strong Bitter tendem a ser mais claras e mais amargas. Mais sabor de malte (especialmente caramelo) e ésteres que uma American Pale Ale, com uma caráter diferente dos lúpulos de finalização.

Estatística Vital:
OG: 1048-1060
FG: 1010-1016
IBU: 30-50
SRM: 8-18
ABV: 4,6-6,2%